De acordo com a Agência de Notícias AhlulBayt (AS) - ABNA - O Brasil é o maior país da América do Sul em área e também o mais populoso. Essas características, somadas à localização geográfica, conferiram ao país influência efetiva na região latino-americana.
A língua oficial do Brasil é o português e a sua religião é o Cristianismo Católico, mas a expressão de crenças e cultura dos cidadãos de todas as religiões neste país é livre, e a formação de pequenas comunidades no Brasil também é livre, o que tem desempenhado um papel efetivo no desenvolvimento e crescimento da economia e de vários outros campos do Brasil.
A população do Brasil é de mais de 207 milhões de pessoas. Lá, seguidores de diferentes religiões convivem confortavelmente, e ninguém tem o direito de atacar ou insultar seguidores de outras religiões.
Os Xiitas brasileiros estão envolvidos em diversas atividades nos centros islâmicos, e o interesse dos brasileiros em aprender sobre a cultura islâmica e Xiita, aumenta a responsabilidade dos missionários neste país.
Segue uma entrevista entre um repórter da ABNA com Nassereddin Khazraji, diretor do Centro Islâmico Arresala, sobre as atividades mais importantes do centro e a situação dos Xiitas brasileiros em várias dimensões, tais como, religiosas, culturais e sociais. Segue a primeira parte dessa entrevista:
ABNA: Primeiro, conte-nos sobre a história da presença dos muçulmanos no Brasil para que possamos começar com as perguntas.
O Brasil é um dos maiores países do mundo e o maior país da região da América do Sul. Este país fala a língua portuguesa porque foi colonizado por Portugal. O Brasil tem uma população de cerca de 220 milhões de pessoas. Sua área é de mais de 7 milhões de quilômetros quadrados e é um dos maiores e mais importantes países da região.
O povo brasileiro é uma mistura de povos de todo o mundo, e a população de indígenas que foram os habitantes originais do Brasil é limitada. O Brasil é um país muito receptivo a imigrantes, e por décadas, várias pessoas vieram do Japão, Itália, países europeus e até países árabes; por isso a nação brasileira tem uma identidade muito diversa. A comida e a cultura do Brasil é vasta, e sua língua também é muito diversa, com palavras vindas de outros idiomas, até do árabe.
Os muçulmanos veem neste país um lugar que não tem os problemas e questões que existem em seus próprios países, e é por isso que ele lhes deu uma sensação de paz e uma grande oportunidade de viver, fazer negócios e educar seus filhos.
O Brasil é a pátria dos muçulmanos, eles a amam e estão fazendo o máximo para garantir que este país progrida a cada dia e que a cultura de convivência e respeito entre todas as etnias e a diversidade de religiões e culturas continue.
Diz-se que os muçulmanos estão presentes no Brasil desde o período colonial; há 500 anos atrás, quando o Brasil foi colonizado pelos portugueses, os muçulmanos entraram na região como escravos em navios. Um evento muito importante na história brasileira chamado Revolução do Mali foi registrado pelos muçulmanos, que era contra a senhoria, e a favor dos escravos, logo contra a opressão. Os escravos muçulmanos foram extintos com o tempo e perderam a sua identidade.
A segunda fase foi composta por muçulmanos que imigraram para o Brasil vindos de vários países, como Líbano e Síria, há cerca de 150 a 200 anos atrás. Os muçulmanos, formados por Xiitas e Sunitas, se estabeleceram em diferentes lugares. Na terceira e mais importante etapa, as guerras civis no Líbano e no Iraque fizeram com que muitos Xiitas imigrassem para o Brasil. Os Xiitas vieram para o Brasil há cerca de 50 anos em vários estágios durante as guerras civis libanesas, a guerra de 2006 e as guerras de 2010 no Iraque e na Síria. Agora temos muitos afegãos que saíram do Afeganistão, e cerca de 3 a 4 mil deles se estabeleceram no Brasil. Hoje não há estatísticas exatas sobre o número de Xiitas no Brasil, mas acredito que haja aproximadamente 30 a 40 mil no total, ou até mesmo 50 mil.
ABNA: Qual é a atual porcentagem de muçulmanos?
As estatísticas de muçulmanos não são muito claras, mas acredito que sejam cerca de 500 mil pessoas espalhadas em diversas cidades como São Paulo, Curitiba, Foz do Iguaçu e cidades fronteiriças. Dessas 500 mil pessoas, 10% são Xiitas, pertencentes à várias nacionalidades. Claro, a maioria deles é libanesa, mas também temos pessoas da Síria, Irã, Iraque, Afeganistão e outros países.
ABNA: Esses muçulmanos se tornaram membros do parlamento ou prefeitos no Brasil?
Sim, os muçulmanos estão presentes em várias posições, e seu nível de conexão e comprometimento com a religião depende do ano de sua imigração. Por exemplo, crianças que chegaram ao Brasil há 150 ou 200 anos atrás foram completamente assimiladas à sociedade brasileira, e sua identidade islâmica se limita a um sobrenome. Esse grupo não tem muita adesão ao islamismo, mas os grupos que entraram no Brasil depois de 2000 e da guerra do Líbano são mais comprometidos e tentam manter suas famílias e filhos dentro do ambiente religioso. Muitos desse segundo grupo trabalham no Brasil e enviam seus filhos para o Líbano quando crescem, enquanto eles próprios trabalham no Brasil e visitam suas famílias por um ou dois meses por ano. Porque estão presos a questões religiosas e não veem o Brasil como um lugar adequado para seus filhos.
Então, sim, os muçulmanos estiveram e estão representados na Câmara Municipal, e em Assembleias Brasileiras no geral.
ABNA: Os muçulmanos que ocupam cargos apoiam os outros muçulmanos?
Ser muçulmano, cristão ou judeu não dá vantagem a ninguém no Brasil. Porque o Brasil é um país laico e todos devem defender e respeitar os direitos do seu próximo; especialmente os direitos das minorias, e os muçulmanos estão entre as minorias. Naturalmente, a presença de um muçulmano em uma alta posição no Brasil, é uma forma de proteção aos direitos das pessoas. Uma pessoa deve alcançar essa posição por meio de seu próprio esforço, e ao mesmo tempo, não deve abusar de seu status de muçulmano, cristão ou judeu para seu próprio benefício, a constituição brasileira protege os direitos de todas as minorias, tão como os dos muçulmanos. Por vezes, os muçulmanos foram relacionados a certas palavras errôneas, fato o qual, o governo brasileiro se opôs fortemente, pois o governo deste país sempre apoiou os direitos dos muçulmanos e de todas as religiões, seitas e minorias.
Nosso objetivo é fortalecer a identidade dos Xiitas, e para isso, um dos caminhos mais importantes e proeminentes é o caminho do conhecimento. Independente do que eu pense, não vejo outro caminho. Por isso, produzir conteúdo em português é o objetivo mais importante do nosso centro, esse que seguimos desde os primeiros anos da presença do Sheikh Taleb Khazraji no Brasil, que foi em 1980.
ABNA: Há uma onda de islamofobia na Europa, nos Estados Unidos e em todo o mundo. Qual é a opinião dos brasileiros sobre os muçulmanos?
Naturalmente, a atividade constante da mídia estrangeira e internacional e as alegações que acontecem contra os muçulmanos há décadas fizeram com que a mentalidade do povo brasileiro se tornasse um tanto negativa em relação aos muçulmanos, mas vimos bênçãos na guerra contra Gaza.
Entre suas bênçãos estava o fato de que as pessoas do mundo sentiram a diferença entre a frente terrorista e a frente de resistência, e perceberam que o grupo de resistência não tinha nada a ver com terroristas. Quando os povos do mundo viram quanto ódio os sionistas têm contra a resistência e contra o movimento que quer fortalecer a honra, a dignidade e a independência de uma nação, eles entenderam a posição da frente de resistência. Os sionistas não têm nenhuma misericórdia, nem mesmo para com um deles mesmo. Eles o oprimem e o arrastam para o tribunal com as piores acusações e culpas. Graças a Deus, as pessoas entenderam que a questão do terrorismo é uma questão de propaganda e política, não uma questão real.
Nos últimos 15 meses, sentimos isso e vimos o quanto o povo brasileiro concorda, defende e apoia o movimento de resistência. Esta é uma grande bênção que devemos preservar. Mas, infelizmente, no geral, a mídia faz o seu trabalho e consegue distorcer a mente das pessoas até um certo ponto.
ABNA: Vemos ataques a centros islâmicos em algumas cidades da Europa. Já aconteceram incidentes assim no Brasil?
Isso acontece muito raramente, e se acontecer, se resolve rapidamente. A mídia brasileira reflete essas questões e não permite que esses casos continuem. Uma questão importante no Brasil é a convivência e o respeito ao próximo. Esforços estão sendo feitos para garantir que todas as religiões respeitem umas às outras. Não aceitamos que um muçulmano insulte outra religião, crença ou grupo. Esta é a lógica do Islã, dos Ahlulbayt (A.S.) e do Profeta Muhammad (que a paz esteja com ele). Todas as religiões devem ser respeitadas. Em diversas ocasiões, nos encontramos e convidamos às nossas mesquitas os cristãos e seguidores de outras religiões, e essa é nossa lógica e política. Tentamos apresentar os muçulmanos como bons modelos entre as pessoas. O Imam Sadiq (A.S.) diz: “Use além da sua língua para suplicar por todos.” Há também um dito do Imam Reza (A.S.) que diz: "Se eles aprenderem as virtudes de nossas palavras, deixe que nos sigam." Embora o povo brasileiro não saiba nada sobre os Ahlulbayt (A.S.) e o islamismo, quando se familiarizam com os costumes, a vida e os ensinamentos dos Ahlulbayt (A.S.), é impossível que não os aceitem, porque os ensinamentos dos Ahlulbayt (A.S.) são compatíveis com a natureza humana.
ABNA: Por que os missionários Xiitas não estão presentes em várias regiões brasileiras, apesar de haver a liberdade religiosa?
Primeiramente, há o problema da distância. Se você quiser ir do Irã para o Brasil, você tem que estar preparado para uma viagem de pelo menos 24 horas. A segunda questão é a questão dos custos. A má situação econômica do Irã levou à prioridade as regiões vizinhas, ou no máximo África e Ásia, porém o Brasil é uma região intocada, e quanto mais cedo e mais trabalho for feito nessa região, melhores resultados serão alcançados.
O Sheikh Taleb Khazraji foi ao Brasil há cerca de 36 ou 37 anos atrás; claro que haviam outros missionários, mas ele começou a trabalhar com os nativos e continuou esse trabalho sozinho, silenciosamente, de uma forma particular. Seria uma grande pena se autoridades, organizações, grupos e missionários não fossem visitar este país.
ABNA: Você tem alguma estatística sobre os centros islâmicos muçulmanos e Xiitas no Brasil?
Em todo o Brasil, os muçulmanos têm cerca de 100 a 120 centros islâmicos, mesquitas, associações, salas de oração e escolas, dos quais 10 a 15, ou no máximo até 20 deles são Xiitas. Os centros e comunidades Xiitas estão localizados em diversas áreas de São Paulo, Curitiba, Foz, Ponta Grossa, e entre outras cidades.
ABNA: A quais países esses centros estão afiliados?
Eles não são afiliados a nenhum país e são centros islâmicos com direções próprias. A Mesquita do Profeta Muhammad (que a paz esteja com ele e sua purificada família) na cidade de São Paulo, a Mesquita Imam Khomeini (RA) e a Hussainia na cidade de Foz, a Escola Libanesa também na cidade de Foz, a Escola Islâmica Brasileira na cidade de São Paulo, o Centro Islâmico do Brasil, o Centro Islâmico Imam Mahdi (que Deus apresse a sua vinda), a Mesquita Imam Ali (que a paz esteja com ele) na cidade de Curitiba, a Mesquita Imam Ali (que a paz esteja com ele) na cidade de Ponta Grossa, a Mesquita Fátima Zahra (que a paz esteja com ela) na cidade de Guarapuava, a Mesquita do Profeta Muhammad (que a paz esteja com ele e sua purificada família) na cidade de Ponta Grossa, o Centro Imam Sadiq (que a paz esteja com ele), e outros centros dos quais não me lembro no momento.
ABNA: Quais desses centros são mais ativos?
A Mesquita do Profeta Muhammad (S.A.A.S) em Curitiba realiza atividades públicas presenciais, como reuniões, súplicas, e orações de sexta-feira. Este centro é um dos centros que tem mais atividades para o público. Com as bênçãos de Deus, o Centro Islâmico do Brasil está na liderança das atividades de traduções de livros e produção audiovisual. Com a permissão e ajuda de Deus conseguimos seguir em frente neste caminho e inshaAllah continuaremos da melhor forma possível. É claro que enfrentamos uma série de problemas, um dos quais é a falta de colaboradores. Precisamos de colaboradores e recursos financeiros, porque certo tipo de conteúdo deve ser produzido de uma forma real, sem o uso da IA, nesse caso, um exemplo é a publicação e edição de livros.
ABNA: Descreva as atividades do seu centro. Além disso, descreva suas atividades online.
Nosso centro começou seu trabalho quase exclusivamente traduzindo livros, e o objetivo era principalmente produzir conteúdo físico. Depois de 1994, o primeiro livro em português sobre a vida e o caráter do Profeta (que a paz esteja com ele e sua purificada linhagem) e os Ahlulbayt (A.S.), foi escrito pelo Sheikh Khazraji. Depois disso, graças a Deus, o caminho foi aberto e vários livros, como Princípios da Religião, Oração no Islã, Jejum, Senhora Fátima (A.S.), e etc foram publicados pelo centro. Em 2002 - 2003, a base de informações Arresala foi criada. O site Arresala é hoje reconhecido como referência no Brasil. Este site possui o Alcorão completo, Nahjul-Balagha, Tuhf al-Uqol, Sahifa al-Sajjadiyah e várias outras obras e artigos para visualização e referência. Acredito que mais de 10 a 15 mil artigos foram traduzidos e publicados neste site.
Depois da atenção do público para o ciberespaço, estamos presentes em todas as plataformas, como Facebook, Instagram e etc, mas nossa presença mais forte nas redes virtuais está em uma plataforma que não havíamos planejado a princípio; ou seja, além do site, o YouTube é a nossa rede mais forte, e temos o maior canal islâmico em português com cerca de 18 mil seguidores. A característica especial do YouTube é que ele é como um acervo documentariado. Estamos tentando fortalecer nossa atividade no YouTube, e neste ano, criamos o Arresala Film and Series Group, com um logotipo especial. Nosso objetivo é injetar mais energia no processo de tradução e dublagem de documentários e séries islâmicas e religiosas, especialmente as iranianas, e dedicar mais tempo a essas questões. Alhamdulillah, nos últimos 10 a 15 anos, conseguimos traduzir 15 filmes para o português, incluindo O Dia do Incidente, Muhammad (S.A.A.S), o Mensageiro de Allah e etc. A última série que traduzimos foi a série Mukhtarnameh, que teve um grande público e foi muito bem recebida pelas pessoas. Além disso, o filme "Os Companheiros da Caverna" será lançado durante o mês do Ramadã, se Deus quiser.
ABNA: Como é seu relacionamento e interação com o governo brasileiro?
No geral, nossa interação com o setor governamental é boa. Nós os respeitamos, nós os convidamos às nossas mesquitas, eles nos reconhecem como um centro oficial e temos uma interação muito boa com eles. Não temos nenhum problema com o governo brasileiro a esse respeito, estamos em contato com as autoridades e o governo brasileiro há anos, e esse contato há de continuar.
ABNA: Eles não criam nenhum obstáculo para suas atividades?
Não, eles não criam nenhum obstáculo. A única coisa importante é que qualquer centro ou grupo deve trabalhar dentro da estrutura da lei, e nós fazemos isso, com base nas ordens do Líder Supremo e das mais altas autoridades. Basicamente nosso dever religioso é respeitar a lei em qualquer país em que estejamos, e essa deve ser uma das prioridades de todos os centros islâmicos no exterior. Caso os centros islâmicos encontrem quaisquer problemas, eles devem relatá-los às autoridades relevantes para que possam ser resolvidos.
ABNA: Vocês podem realizar cerimônias de luto como Arbain, Muharram e eventos semelhantes fora do centro?
Sim, todos os anos no dia de Ashura, marchamos do centro até o Parque da Independência, que fica aproximadamente 1 quilômetro de distância. A cerimônia começa uma hora antes da oração, e caminhamos até o parque. Neste programa, distribuímos água para as pessoas e retornamos ao centro, onde realizamos a cerimônia de luto.
ABNA: Vocês têm que combinar essas programações com o governo?
Sim, combinamos com a polícia e a prefeitura previamente, e eles são responsáveis por fornecer segurança durante a marcha. Este é o mesmo argumento que apresentei a você, de que a lei brasileira se baseia na liberdade de religião no respeito e convivência com o próximo.
ABNA: Vocês têm alguma programação nos centros islâmicos para o aniversário do martírio do General Soleimani, e do mártir Sayyed Hassan Nasrallah ou para a marcha do Dia de Quds?
Realizamos a marcha do Dia de Quds todos os anos, e vários outros grupos realizam cerimônias para o martírio do General Soleimani, e elas são amplamente bem vistas, porque o General Soleimani é um símbolo da figura da resistência contra o regime sionista, os planos do imperialismo e da arrogância global. Ele foi morto injustamente, o povo brasileiro o ama e o apoia. Eles martirizaram o General Soleimani e tinham o objetivo de retratá-lo como uma figura negativa, mas graças a Deus, a maioria das pessoas têm uma boa visão sobre ele.
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