Agência de Notícias AhlulBayt (ABNA) – Num tempo em que a imagem molda a consciência mais do que as balas no campo de batalha, a Palestina avança para uma nova frente de conflito: a frente da palavra e da consciência. Depois de enfrentarem por décadas a máquina de ocupação no terreno, os palestinos descobriram-se travando uma batalha não menos feroz no espaço digital, uma batalha contra o silenciamento da voz, a distorção da verdade e a falsificação da história. A transformação digital e a revolução contemporânea das comunicações inverteram a equação, concedendo aos palestinos uma arma que tanques não conseguem enfrentar: a mídia digital e a diplomacia midiática.
Primeiro: de vítima a formulador do discurso
O palestino deixou de ser mero objeto nos telejornais para tornar-se agente na construção da narrativa global sobre sua causa. Pelas redes sociais, rompeu-se a hegemonia tradicional dos grandes conglomerados de mídia, que por muito tempo monopolizaram a narrativa dos acontecimentos segundo seus critérios políticos.
Por meio da imagem ao vivo e do vídeo feito no terreno, o palestino conta sua história diretamente ao mundo, sem intermediários e sem edição seletiva dos fatos. As imagens vindas de Gaza e da Cisjordânia inverteram a narrativa israelense, que por muito tempo se apresentou como ‘vítima’, e mostraram ao mundo o verdadeiro rosto da ocupação e de suas políticas de repressão e discriminação.
Segundo: a diplomacia midiática,
uma arma branda tão forte quanto o aço
A mídia hoje deixou de ser apenas um veículo; é uma ferramenta para moldar posturas e formular políticas. Aqui sobressai o conceito de diplomacia midiática, que combina o papel profissional do jornalismo com o papel estratégico das instituições oficiais e de direitos humanos.
Cada entrevista, declaração ou campanha digital organizada pode transformar-se em instrumento de pressão internacional, contribuindo para a formação de um posicionamento global favorável ao direito palestino. Essa integração entre o esforço midiático e o diplomático constitui hoje uma nova frente de luta, alicerçada na imagem, na palavra e na credibilidade.
Terceiro: a batalha da consciência diante dos algoritmos
Apesar do impacto já alcançado pela presença digital palestina, os desafios permanecem enormes. As grandes empresas de tecnologia impõem restrições desproporcionais ao conteúdo palestino sob o pretexto de ‘incitação’ ou ‘violação de normas’, enquanto fecham os olhos para o discurso racista e militarista israelense. Além disso, a coordenação entre a mídia oficial e a popular ainda é limitada, e o investimento em capacitação e em tecnologias modernas permanece aquém do necessário.
Vencer a batalha da narrativa na era dos algoritmos exige compreender os mecanismos digitais que moldam a opinião pública, não apenas sustentar-se no conteúdo ético e justo.
Quarto: rumo a uma estratégia midiática global e integrada
Para que a narrativa palestina se consolide na consciência internacional, é indispensável uma estratégia nacional abrangente que unifique a mídia tradicional, a mídia digital e a diplomacia midiática sob uma mesma visão.
Essa estratégia se apoia em quatro eixos principais:
- Produzir conteúdo profissional e multilíngue que fale à razão e à consciência ao mesmo tempo.
- Capacitar porta-vozes e comunicadores palestinos aptos a representar sua causa com confiança e competência nas plataformas internacionais.
- Construir parcerias estratégicas com jornalistas, acadêmicos e organizações de direitos humanos ao redor do mundo para levar a verdade palestina com profundidade e objetividade.
- Empregar ferramentas de análise digital e inteligência artificial para monitorar tendências da opinião pública e formular uma comunicação eficaz e direcionada.
Quinto: do defensivo à iniciativa
É chegada a hora de a narrativa palestina passar de um estado de defesa permanente a um discurso propositivo, humano e universal, que apresente a Palestina não como mera disputa política, mas como símbolo planetário de liberdade, justiça e dignidade humana.
O mundo hoje não busca o grito, mas a verdade; não a oratória, mas a história autêntica que ilumina a consciência humana. E a Palestina possui isso, pela sinceridade de sua experiência e pela profundidade da injustiça que sofre.
A palavra é uma arma invencível
A batalha pela narrativa palestina não é um luxo midiático, mas uma luta por sobrevivência e identidade. A palavra verdadeira hoje constitui a memória coletiva das nações e preserva a verdade do desaparecimento em meio ao ruído da desinformação.
O palestino que ergue a câmera diante de um tanque, ou que publica um tuíte apesar do bloqueio digital, pratica um ato de resistência tão digno quanto qualquer outra forma de luta.
Em tempos de imagem, a palavra é o último limite da liberdade, e a sua primeira batalha.
Edição de Texto: Alexandre Rocha
Wisam Zoghbour é jornalista, membro da Secretaria-Geral do Sindicato dos Jornalistas Palestinos e diretor da Rádio Voz da Pátria
........................
308
Your Comment