Abna Brasil: O ser humano foi criado com uma natureza (fiṭrah) propensa ao amor, e desde o início da criação, o amor a Deus foi depositado em seu coração. Nenhum afeto preenche o vazio existencial do ser humano exceto o amor de Deus, e a afeição do ser humano por outros indivíduos divinos se forma nesta mesma direção. Por outro lado, o mundo e suas manifestações mundanas têm a capacidade de tomar o lugar do amor verdadeiro (ʿIshq Ḥaqīqī), aprisionando o ser humano em amores materiais (ʿIshq Majāzī). Por esta razão, o crente está sempre envolvido em um campo de batalha entre estas duas formas de amor.
A questão agora é: em qual dessas duas categorias se enquadra o amor pelos Ahl al-Bayt (que a paz esteja com eles)? Este tipo de amor se encontra no círculo do amor real (ʿIshq Ḥaqīqī), ou é do tipo amor figurativo (ʿIshq Majāzī), por ser o amor de um ser humano por outro? E, fundamentalmente, qual é a diferença entre o amor divino e os outros amores mundanos?
Amor e Afeição Divina
Quando o amor e a afeição divinos entram no coração humano, o ser humano não apenas amará a Deus, mas também amará tudo o que for atribuído a Ele. Por esta razão, a afeição pelos Ahl al-Bayt (as), que são seres divinos e trilharam o caminho de Deus, encontrará um lugar especial no coração humano. Este amor conduz o ser humano à gnose (Maʿrifah), às boas ações (ʿAmal Ṣāliḥ) e à purificação da alma (Tahdhīb an-Nafs), sendo da mesma natureza do amor divino.
Por outro lado, o amor figurativo (ʿIshq Majāzī) surge quando o ser humano desvia o caminho natural de seu amor inato (ʿIshq Fiṭrī) do Amado Real, entregando seu coração a um amado não divino. A este respeito, foi dito: "O ser humano foi criado, por sua natureza, como um amante; ou melhor, Deus colocou o amor inato (Ḥubb Dhātī) na natureza de todos os seres, e por causa deste amor inato, os seres se voltam para a Perfeição Absoluta e são buscadores e amantes do Belo Absoluto (Jamīl ʿAla al-Iṭlāq). Em outras palavras, toda existência é misturada com amor (ʿIshq) e afeição (Ḥubb), e a ausência de amor e afeição significa a ausência de existência.
Com base nisso, se um ser humano esvaziar seu coração do amor a Deus, devido ao fato de que o amor pela perfeição está em sua essência, seu coração não pode ficar sem um Amado; portanto, o coração buscará outro amado. E como Deus foi deixado de lado, ele inevitavelmente substitui o Amado real por alguém ou algo não real, a fim de compensar este vazio inerente. Assim, ele se torna afligido pelo amor a algo além de Deus." (1)
Portanto, o amor figurativo (ʿIshq Majāzī) surge quando há um vazio de amor real na alma humana.
Amor Mundano (Em Paralelo ao Amor Divino)
"Se o amor a algo que não é Deus for um amor independente e estiver em paralelo (dar ʿarḍ) ao amor a Deus, a união entre os dois não é possível, pois o ser humano possui apenas um coração. Portanto, não é possível que alguém combine duas crenças conflitantes ou duas opiniões contraditórias. Se duas crenças forem conflitantes, devemos saber que dois corações acreditam nelas; isto é, dois indivíduos opostos, cada um acreditando em uma das crenças. Assim, o amor e a afeição por Deus, e o amor que se opõe ao amor a Deus e está em paralelo a ele, não cabem no mesmo coração.
Com base nisso, se o amor e a afeição por algo que não é Deus tiverem conquistado todo o coração humano, seu coração será um coração que foi esvaziado da existência de Deus." (2)
Portanto, quando um ser humano se apaixona por algo não divino e se torna afligido pelo chamado amor figurativo (ʿIshq Majāzī), este amor está em paralelo (dar ʿarḍ) ao amor de Deus, e não há possibilidade de unir os dois. Tal amor ocupa completamente o coração, esvaziando-o da Presença Divina e aprisionando o ser humano a apegos instáveis.
Amor pelos Ahl al-Bayt (as) (Em Sequência ao Amor Divino)
O amor que está em sequência (dar ṭūl) ao afeto divino aproxima o ser humano de Deus. O amor pelos Ahl al-Bayt (as) é deste tipo. O crente utiliza meios de intercessão (wāsiṭah) para alcançar a verdade e descobrir a gnose (Maʿrifah). Os melhores intercessores são os Ahl al-Bayt (as); portanto, este amor, assim como o amor pelo Deus Exaltado, se enquadra no círculo do amor real (ʿIshq Ḥaqīqī).
Na perspectiva do Islã, a afeição pelo Profeta e pelos Ahl al-Bayt é considerada a extensão do amor divino. No entanto, há um ponto sutil: o amor pelos Ahl al-Bayt não se destina apenas a criar uma emoção pessoal e individual; em vez disso, a condição deste amor é que ele esteja ligado à gnose (Maʿrifah) para que possa levar o ser humano ao seu destino pretendido.
A recomendação para a peregrinação (Ziyārah) e o recurso (Tawassul) aos Ahl al-Bayt (as), acompanhando esta peregrinação com o elemento de gnose, é para que a afeição aos Infallíveis (as) vá além da mera dimensão emocional e alcance o significado. Talvez uma das razões para a proibição de sair dos padrões legais (Mawāzīn Sharʿī) nas cerimônias de luto e na preservação dos ritos religiosos (Sha'āʾir Dīnī) seja garantir que este amor também permaneça em seu caminho correto, que é o amor a Deus.
Diferenças Entre os Dois Amores
Para distinguir estes dois tipos de amor, pode-se atentar para vários critérios:
- Orientação:
- O amor real (ʿIshq Ḥaqīqī) é voltado para Deus e a Perfeição Absoluta; o amor figurativo (ʿIshq Majāzī) é voltado para o mundo e o ego (Nafs Ammārah - o ego que comanda o mal). Por exemplo, o amor real se forma no contexto de cumprir o obrigatório (wājib) e abandonar o proibido (ḥarām), enquanto o possuidor do amor figurativo pode facilmente violar os preceitos divinos.
- Impacto Ético:
- Outra diferença entre os dois amores é seu impacto na moralidade (Akhlāq). À luz do amor real, o crente se torna imbuído de virtudes morais e evita os vícios; no amor figurativo, tal resultado não é necessariamente alcançado. Imam Ali (as) diz:
- "Aquele que se encanta por algo, este algo cega seu olho e adoece seu coração; tal pessoa olha com um olho insalubre e ouve com um ouvido surdo; as paixões rasgaram sua razão e o mundo matou seu coração." (3)
- Diferença no Objetivo:
- Nos amores mundanos e terrenos, estão em jogo motivações materiais, como necessidades pessoais, desejos emocionais, obtenção de benefício, satisfação do instinto, etc. O possuidor do amor figurativo não pensa em nada além do prazer, e é aqui que o sinal do egocentrismo é visível. No amor divino, o objetivo é a proximidade (Taqarrub), e o crente não tem motivação além da obediência e da adoração.
- Impacto do Amor no Significado da Vida:
- O amor real é eficaz em dar significado à vida humana. Pois o ser humano sabe que ama Alguém que é imperecível e ama aqueles cuja afeição leva a um maior significado para sua vida. No entanto, no amor figurativo, o vazio espiritual reaparece após o arrefecimento das emoções, e pode até levar o ser humano ao niilismo.
- "A experiência dos pacientes mostrou que estes amores e apegos viciantes podem ser desejáveis e doces no início, mas gradualmente seus efeitos destrutivos se tornam aparentes. Ansiedade, estresse, medo, expectativas impróprias e excessivas, frustração, numerosos mal-entendidos e um sentimento de posse em relação à outra parte, e finalmente, cansaço e aversão, são assuntos que aumentam a dor e o sofrimento do indivíduo." (4)
- Tomada de Modelo:
- Outra diferença importante entre o amor real e o figurativo reside no tipo de tomada de modelo (Ulgūgīrī) do ser humano. Quando os Ahl al-Bayt são reconhecidos como modelos da manifestação da verdade, a afeição por eles é um amor que arrasta a alma para a verdade existencial e obriga o ser humano a tomar Seus exemplos. Mas esta característica no amor figurativo pode crescer em uma direção negativa, pois o amado que o amante toma como modelo pode não ser um modelo real.
- Estabilidade (Pāydārī):
- Outra característica do amor real é seu poder de estabilidade. Aqueles que são adeptos do amor a Deus e aos Ahl al-Bayt (as) estão dispostos a suportar todo tipo de dificuldade neste caminho e ir até o sacrifício de suas vidas, como os mártires que ofereceram suas vidas em amor com a menção de "Yā Ḥusayn!" Mas não há tal resistência no amor figurativo. Nos amores figurativos, se o benefício desaparece, o amor diminui e sua natureza muda.
- Vínculo com a Gnose (Maʿrifah):
- Um dos requisitos inseparáveis do amor real é a gnose (Maʿrifah); mas no amor figurativo, o sentimento é suficiente. Ou seja, todo ser humano pode se envolver com o amor figurativo por possuir a característica da emoção; mas nem todo ser humano é adepto da gnose, e por esta razão, o amor pelos Ahl al-Bayt (as) não é concedido a todo coração.
Conclusão
O ser humano é criado como um amante por natureza, e a raiz de todas as afeições reside no amor divino. Sempre que este amor real se manifesta no coração humano, todas as suas afeições encontram significado no caminho divino, e o amor pelos Ahl al-Bayt (as) se forma nesta mesma direção e em sequência (dar ṭūl) ao amor a Deus.
Contudo, quando o coração está vazio da lembrança de Deus, o amor figurativo o substitui, e o ser humano se apega a assuntos que estão em paralelo (dar ʿarḍ) ao afeto divino e o afastam da verdade.
Portanto, o critério para distinguir entre amor real e figurativo é a sua orientação. Se o amor de uma pessoa a aproxima de Deus e leva à excelência moral, gnóstica e espiritual, ele é real; mas se leva à negligência, egocentrismo e apego ao mundo, ele será figurativo. O amor pelos Ahl al-Bayt (as), por estar no caminho da gnose e da Proximidade Divina (Qurb Ilāhī), é um exemplo de amor real e guia o ser humano à perfeição, virtude e paz duradoura.
Notas de Rodapé:
- Anṣārīyān Pūr, ʿAlī & Diyānat Muqaddam, Sayyid ʿAbbās, Taḥlīl-e Pursishhā-ye Akhlāqī az Maʿṣūmīn, vol. 1, p. 199.
- Anṣārīyān Pūr, ʿAlī & Diyānat Muqaddam, Sayyid ʿAbbās, Taḥlīl-e Pursishhā-ye Akhlāqī az Maʿṣūmīn, vol. 1, p. 200.
- Nahj al-Balāghah, Sermão 109, p. 160.
- Anṣārīyān Pūr, ʿAlī & Diyānat Muqaddam, Sayyid ʿAbbās, Taḥlīl-e Pursishhā-ye Akhlāqī az Maʿṣūmīn, vol. 1, p. 206.
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