Segundo as palavras de Amir al-Mu’minin (a.s.), existem três inimigos internos que, se não forem vigiados, esvaziam o ser humano por dentro. São eles: a ambição desmedida (ṭama‘), a exposição das dificuldades pessoais e a língua indisciplinada.
Essa orientação constitui um verdadeiro mapa para preservar a honra e a dignidade humana, aquele valor interior de que cada pessoa necessita para crescer e encontrar paz.
Este ensinamento é uma das bases da ética transmitida por Imam Ali (a.s.), contendo três advertências fundamentais sobre:
o perigo da ambição,
a revelação das aflições,
e a falta de controle da língua.
A ambição — o inimigo silencioso da dignidade
A ambição, aqui, significa o desejo interminável de “ter mais”: não apenas riqueza, mas também ser visto, aprovado ou desejado. A raiz árabe de ṭama‘ exprime “olhar para algo com avidez”.
Imam Ali (a.s.) declara:
“Aquele que deixa a ambição instalar-se em seu coração, rebaixa a si mesmo.”
No sentido lexical, ṭama‘ é um querer ilimitado que obscurece a razão e escraviza o coração. A ambição é, assim, o oposto de qana‘ah — a satisfação com o que Deus concedeu.
A ambição revela desconfiança na justiça divina.
O Alcorão também apresenta o ṭama‘ como sinal de insatisfação interior:
“E, ainda assim, ele ambiciona que Eu aumente.” (Al-Muddathir, 15)
A pessoa afastada de Deus torna-se incessantemente exigente; seus desejos não têm fim.
Na vida moderna, a ambição manifesta-se de novas formas:
– um funcionário que abandona a honestidade para conquistar um cargo;
– um jovem que sacrifica sua autenticidade por curtidas;
– um juiz que, por dinheiro, profere julgamentos injustos.
A ambição corrói a autoestima, coloca o ser humano em permanente comparação e gera uma insatisfação constante.
A cura para a ambição é a qana‘ah, a satisfação digna e consciente.
A pessoa satisfeita é soberana sobre si mesma.
Perigos da ambição
- Destruição da dignidade interior — porque cria dependência.
- Escravidão mental — pois as decisões passam a depender do desejo dos outros.
- Insatisfação permanente — pois quem ambiciona nunca se sacia.
O perigo de expor dores e segredos pessoais
Muitas pessoas não conseguem guardar suas dificuldades. À primeira vista, desabafar parece aliviar, mas o hábito constante de queixa rebaixa a posição da pessoa diante dos outros.
A raiz de dhull significa “humilhação, rebaixamento”.
Aquele que expõe continuamente seus problemas acredita que obterá apoio ou compaixão. Contudo, como afirma Imam Ali (a.s.):
“Aquele que revela suas aflições aceita para si a humilhação.” [1]
Consequências da exposição de dificuldades
– Perda de confiança e respeito alheio;
– Enfraquecimento espiritual — relembrar a dor intensifica-a;
– Dependência psicológica da compaixão dos outros.
Imam Sajjad (a.s.) suplica em Du‘ā Makārim al-Akhlāq:
“Cobre as minhas falhas e tranquiliza o meu coração.” [2]
Preservar a honra, mesmo nas dificuldades, é parte essencial da ética do crente.
No mundo atual, exemplos são abundantes:
– nas redes sociais, quando alguém expõe problemas familiares para obter pena;
– entre amigos, quando a pessoa sempre relata desgraças para buscar atenção;
– na família, quando dificuldades privadas são expostas;
– nos ambientes de estudo ou trabalho, onde a repetição constante de queixas prejudica a imagem e a autoconfiança.
Perigos da revelação de segredos
– Humilhação;
– Possibilidade de manipulação ou abuso da confiança;
– Julgamentos sociais prejudiciais e perda de reputação.
O caminho seguro
A solução está na paciência e confiança em Deus.
Compartilhar aflições apenas com pessoas extremamente confiáveis e em ambientes discretos protege a dignidade e evita danos emocionais.
A língua indisciplinada — o início do declínio moral
A língua é o espelho da alma. Se não for controlada, afasta a razão e compromete a credibilidade da pessoa.
O Alcorão afirma:
“Nenhuma palavra o ser humano profere sem que haja um guardião atento.” (Qāf, 18)
Imam Ali (a.s.) ensina:
“Aquele que coloca sua língua como governante sobre si mesmo, humilha a sua própria alma.”
“Governar a língua” significa permitir que ela dite comportamentos. A raiz amara significa “ordenar”.
Na atualidade, a língua expandiu-se para o mundo digital: mensagens impulsivas, publicações irrefletidas e respostas rápidas podem destruir a reputação de alguém em segundos.
Controlar a língua é escolher o silêncio ponderado e a reflexão antes de falar.
Quando a língua governa, os danos surgem:
– perda de respeito e credibilidade;
– conflitos, difamações e danos irreparáveis;
– propagação de mentira, boato e agressão verbal.
Exemplos modernos
– o adolescente que xinga em um impulso online;
– o funcionário que faz uma piada indevida e perde o posto;
– alguém que comenta irresponsavelmente na internet e arruina sua imagem;
– quem calunia e destrói vidas com palavras.
Conclusão
Hoje, muitos estão presos a esses três inimigos ocultos:
a ambição,
a exposição das aflições,
e a língua indisciplinada.
A ambição vende a liberdade interior;
a queixa destrói a dignidade;
a língua descontrolada arruína relações e reputações.
Mas há saída:
qana‘ah, paciência e silêncio ponderado.
Basta perguntar a si mesmo:
“Este comportamento me eleva ou me diminui?”
Se conduz à dignidade, então é o caminho que Imam Ali (a.s.) nos ensinou — rumo à serenidade, respeitabilidade e verdadeira liberdade interior.
Esses três princípios —
qana‘ah contra a ambição,
paciência contra a queixa,
e silêncio ponderado contra a língua impulsiva —
se unem em uma única fonte:
autoconhecimento e autocontrole.
No mundo barulhento de hoje, em que a exibição substituiu a sinceridade, esse ensinamento milenar permanece surpreendentemente atual.
Conheçamos esses três inimigos ocultos e não deixemos que habitem o nosso interior — pois a verdadeira derrota ocorre quando o ser humano a si mesmo se rebaixa.
Referências
[1] Nahj al-Balāghah, Hikmah 2.
[2] Ṣaḥīfah al-Sajjādiyyah, Du‘ā 20.
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